quinta-feira, 20 de novembro de 2014

CADERNO HUMANÍSTICO Nº 4

                                                

                     Há alguns anos atrás batia em minha porta, pedindo alimentos uma menina de seus onze, ou doze anos. Doía-me o coração de vê-la tão novinha pedindo e o que era pior, acompanhada dos irmãos menores.
Não me contentava em só satisfazer sua fome dando-lhe algo para comer. Sempre iniciava uma conversa par saber mais de si e da família.
                  Seu nome era Ana depois mais dois meninos menores e a pequena, com uns três anos de idade que chupava bico, chamava se Mary e carregava de arrasto uma bonequinha.  Ela vinha com frequência e como é comum sempre perguntava se tinha algo mais, uma roupa, um brinquedo.
                 Conversando com a mais velha descobri que elas moravam perto dos trilhos do trem e que nenhum dos irmãos tinha certidão de nascimento. Fiquei apavorada. Ficariam sempre à margem da escola. Anotei meu endereço em um papel e entreguei para ela levar à mãe dizendo-lhe que ela me procurasse que eu a encaminharia para tirar as certidões de todas as crianças. Via como as situações se repetiam. Em uma época anterior, quando fazia o magistério trabalhei no Censo escolar realizado pelo governo do Estado e a quantidade de crianças sem documentos e fora da escola era grande em uma vila que hoje nem existe mais.
                 Ficamos amigas. Em data de aniversário de um deles ela vinha e me pedia o que necessitava para fazer um bolo. Eu dava e sempre cobrava a presença de sua mãe para conversarmos. Ela nunca apareceu. Pelo contrário, as crianças sumiram.
Passou-se mais de um ano, eu creio.  Certo dia  andando pelo cetro da cidade em meio às pessoas que transitavam no calçadão eu ouvi alguém chamando:- Tia!
Parei e virei-me para o lado de onde vinha a voz. Fiquei estarrecida. Era ela a Ana, a Mary, ainda com um bico e no colo de Ana uma criança. Surpresa fui falar com ela, Perguntei-lhe por onde andava e ela respondeu o que eu já imaginava e temia. Tinha engravidado e o bebê era seu filho.
                   Tentei saber mais, mas ela nada me falou, foi empurrando a pequena para seguir adiante e lá se foi com o filho no colo. Disse que um dia apareceria.
                   Nunca mais a vi. Qual seria seu destino? E o de Mary? Pobres crianças tão pequenas e já sem perspectiva de um futuro digno.
      Isabel C S Vargas
      Pelotas-RS-Brasil

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